Quanto mais perto do fim eu chego,mais tenho certeza de que a esperançaé o meu melhor investimento. Nietzsche
- Rui Miguel
- 30 de jun. de 2024
- 4 min de leitura
Atualizado: 18 de jul. de 2024
Por: Rui Miguel Trindade dos Santos
Quando uma pessoa passa por um problema de saúde grave e que talvez precise de cuidados especiais, principalmente quando esse revés de sua vida acontece muito drasticamente, ela passa repentinamente de uma pessoa saudável, útil e independente e começa a ser dependente de outro ser humano para as coisas mais básicas da vida. Essa pessoa talvez já tenha passado por momentos em que sua dignidade foi colocada de lado e infelizmente ele tem que aceitar isso.
Não há dignidade na doença e não há dignidade na morte. Então não diga a uma pessoa que passa por certos problemas de saúde ou que vive os momentos conclusivos de sua existência que certos atos ou dizeres possam trazer mais dignidade a tal experiência. A perda de dignidade nessa fase da vida não pode ser substituída por palavras e ações generosas.
O simples fato de você estar presente ou ajudar em qualquer tarefa já é muito importante para quem está sendo cuidado. Então simplifique sua generosidade em apenas se importar, nada mais.
Um cuidador que possui sentimentos pela pessoa de que cuida (seja familiar ou amigos próximos) precisa da ajuda de todos, tanto quanto a quem possui a doença. Eu digo isso com toda convicção: Se quiser ajudar a uma pessoa que passa por uma situação de doença grave, visite sim essas pessoas, mas visite principalmente a pessoa que está cuidando de nós. Se importe com ela, veja do que ela está precisando. Ajude-a em sentido tanto material quanto mental e até mesmo espiritual.
Os cuidadores precisam de cuidados. Visite-os e seja amigo de maneira prática; ouça-o. Eles passam por momentos difíceis e precisam conversar, precisam de alguém que não fale o tempo todo de como as coisas vão melhorar e que tudo isso vai passar um dia. Apenas ouça. Não fale nada. Não tire conclusões, não tente finalizar a conversa com uma lição de moral e, principalmente, não seja catequista, querendo sempre ter razão. Sua visita não tem que ser finalizada com uma linda lição de amor.
Eu sei, eu sei. É muito simples, não é mesmo? Então se é simples, faça-o da maneira mais singela possível e, quando acabar, um abraço apertado e afetuoso fará com que você conclua essa experiência de uma maneira que o cuidador nunca vai esquecer. Mesmo que você não diga nada, vai ser uma das melhores conversas que essa pessoa terá nesses dias.
Para nós, pessoas a serem cuidadas, ver que as necessidades de nossos cuidadores estão sendo afetuosamente levadas em consideração e que seus sentimentos estão sendo elevado a um grau de importância que os faz sentirem-se bem, nos ajuda muito saber que quem se desgasta física e emocionalmente por nós recebe amparo, respeito e cuidado. Nossa consciência fica muito mais tranquila apesar do infortúnio que damos às pessoas que nos amam. Eu acredito na frase de Dalai Lama que diz: “Creio que a pessoa que teve mais experiência de privações consegue enfrentar problemas com mais firmeza que a pessoa que nunca passou por sofrimento. Portanto, visto por esse ângulo, um pouco de sofrimento pode ser uma boa lição para a vida”.
Eu digo que, se não há dignidade na pessoa que passa por uma doença ou por momentos finais de sua vida, também os cuidadores perdem um pouco da sua dignidade. Eles estão de uma maneira obrigados a lidar com uma situação pela qual nunca imaginaram passar, para a qual não estavam preparados naquele momento de sua vida. Não era hora, não desse jeito.
Não se anule pela pessoa que você está cuidando. A realidade da vida é que, se passarmos todo o tempo tentando ajudar todo mundo, acabamos negligenciando nossas próprias responsabilidades, seja ela com família ou outros que também dependem de vocês.
Talvez eles nunca tenham se encontrado nessa situação e agora precisam se desvencilhar de preconceitos para lidar com essa nova realidade. Por mais que pareça uma atitude normal aos olhos de quem vê de fora, não é fácil para uma pessoa que ainda está em plena idade escolar ou para alguém que vive sua juventude profissional ter que dedicar grande parte do seu tempo aos cuidados de um pai, de uma mãe ou de outro familiar que seja totalmente dependente deles.
Posso parecer um pouco desumano, mas temos de encarar a realidade e sermos abertos a nossa situação, pois colocar uma cortina transparente na frente de verdades inconvenientes não vai adiantar absolutamente nada. Assim como não é fácil perder sua dignidade por ter de ter alguém dando banho em você, limpando suas necessidades fisiológicas, alimentando-o, vestindo-o e fazendo outras tarefas intimas, também é muito difícil para quem precisa fazer isso.
Em um momento eles são totalmente livres e estão levando a sua vida, construindo uma felicidade bem estruturada e num piscar de olhos, se tornam responsáveis por limpar e alimentar alguém que provavelmente admiram e por quem foram cuidados. Platão disse: “Os olhos do espírito só começam a ser penetrantes quando os do corpo principiam a enfraquecer”.
Agora falando diretamente para nós que somos cuidados: Precisamos ter o mais alto grau de empatia, pois esta será a nossa maior virtude daqui para frente. Se você não a tem, cultive-a e, se já a possui, mantenha e desenvolva continuamente.
Rui Miguel Trindade dos Santos

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